Bernardo Bortolotti (2021-06-25)
Item Set
Número da coleção
6586_bernardo_bortolotti
Nome(s) do(s) produtor(es)
Bernardo Bortolotti (2021-06-25)
Vínculo
Bolsista
Unidade da Fiocruz
Casa de Oswaldo Cruz
Data de produção
2021-06-25
Título
Contribuição de Bernardo Bortolotti ao projeto "Arquivos da Pandemia: Memórias da Comunidade Fiocruz".
Relato(s)
"Na última semana chegamos ao inacreditável número de 500 mil mortos pela pandemia. Não deveria ter sido assim. Eu me considero sortudo por não ter tido Covid-19 e não ter perdido ninguém para a doença. Hoje estou vacinado com a primeira dose da vacina e com boa parte da minha família e de meus amigos vacinados. Conheço, todavia, muitas pessoas que perderam pais, amigos, avós, filhos. Infelizmente, o cenário é esse: Se você não perdeu ninguém próximo para a Covid-19, com certeza conhece alguém que perdeu. A pandemia não acabou e ainda temos uma média de 2000 mortos todos os dias e a tendência é aumentar nas próximas semanas com a chegada do inverno e da variante Delta. Estamos vivendo um momento muito difícil no Brasil, com uma pandemia devastadora, uma onda de desinformação e um presidente negacionista, que sempre ignorou as recomendações da Ciência, sempre defendeu um tratamento precoce, estimulou aglomerações, lutou contra medidas de distanciamento social e, principalmente, apostou na contaminação coletiva como forma de atingir uma suposta imunidade de rebanho. Temos o pior presidente possível para a pior pandemia do século XXI.
Os primeiros meses de pandemia foram desafiadores. Ainda havia grande incerteza sobre as formas de contaminação do Novo coronavírus, o que me fez ficar em casa com minha noiva e minha cadela Frida quase sem sair de casa, basicamente saindo para ir ao mercado ou à farmácia. Por vezes, nós ficávamos sem dormir porque estávamos sem conseguir um trabalho fixo e vivendo praticamente de economias, além disso havia o medo de sermos infectados pelo vírus, Um dos momentos mais tristes foi um dia à noite quando eu ouvi funcionários do IML retirando o corpo de uma senhora que morava no meu andar. Até hoje eu não sei se ela faleceu de Covid-19, porque era uma senhora solitária, sem filhos e com os sobrinhos morando fora da cidade. Eu até cheguei a ajudá-la indo na farmácia e na banca de jornal, mas por conta da pandemia quase ninguém saía de casa. A pandemia teve um impacto grande no meu trabalho em 2020. Como trabalhava com a digitalização de documentos audiovisuais e dependida de equipamentos de meu sócio que estavam num coworking, não conseguia trabalhar e, ao mesmo tempo, todos os projetos que estavam acertados, acabaram suspensos. Foi um momento de muita incerteza e com as minhas economias indo embora com gastos de aluguel e alimentação, onde refleti muito sobre os meus rumos profissionais. No começo do ano passei para o mestrado na Universidade de Amsterdam e pensei que seria bom ter uma experiência fora do Brasil, Já estava com a passagem comprada para Setembro, quando veio a pandemia. Em parte, foi bom porque pude assistir as aulas remotamente e em, teoria, economizei um grande valor em Euros. Mas como esse Mestrado tinha muitas experiências práticas, acabei perdendo muitas oportunidades que as turmas dos anos anteriores tinham (visitas técnicas, oficinas, disciplinas práticas, etc...). Meu vôo foi adiado três vezes. O Brasil virou um pária internacional com o surgimento da variante P1 aqui e nenhum país estava recebendo mais brasileiros. Acabei fazendo todas as disciplinas online e hoje preciso fazer um estágio, mas diferente dos meus colegas que estão na Europa, estou com dificuldades em ser aceito em alguma instituição de lá. A instituição tem sido muito compreensiva com as minhas dificuldades acadêmicas e até para encontra o estágio, mas ainda assim o cenário é de incerteza quanto ao futuro.
Em meados de Setembro de 2020, o coworking onde estavam os equipamentos de meu sócio foi reaberto e alguns projetos voltaram. Acabei me arriscando, pegando o metrô em horários alternativos para evitar aglomerações para conseguir algum dinheiro para me sustentar. Fiquei com suspeita de Covid em pelo menos 3 vezes, mas fiz o teste PCR e o resultado foi negativo. Segui com os escassos trabalhos que permitiram pagar as minhas contas. No começo de 2021, fui chamado para ser bolsista do projeto "Arquivos da Pandemia...", na Casa de Oswaldo Cruz, o que para mim foi um grande alívio e uma enorme satisfação. De pronto aceitei trabalhar com excelentes profissionais e em uma instituição que já fez tanto pelo Brasil e talvez seja a principal responsável, junto com o Instituto Butantã e o SUS, por atenuar as graves consequências da pandemia e do desgoverno. Como bolsista desse projeto, me sinto responsável por trazer um pouco da minha vivência durante a pandemia e contribuir com alguns momentos em imagens de um dos períodos mais complicados pelo qual eu passei. Minha mais grata e querida contribuição foi a minha foto sendo vacinado com a vacina produzida pela Fiocruz justamente no mês em que chegamos aos 500 mil mortos. Foi e continua sendo muito difícil, mas obrigado a todos aqueles e aquelas que contribuem para vencermos esse pesadelo".
Os primeiros meses de pandemia foram desafiadores. Ainda havia grande incerteza sobre as formas de contaminação do Novo coronavírus, o que me fez ficar em casa com minha noiva e minha cadela Frida quase sem sair de casa, basicamente saindo para ir ao mercado ou à farmácia. Por vezes, nós ficávamos sem dormir porque estávamos sem conseguir um trabalho fixo e vivendo praticamente de economias, além disso havia o medo de sermos infectados pelo vírus, Um dos momentos mais tristes foi um dia à noite quando eu ouvi funcionários do IML retirando o corpo de uma senhora que morava no meu andar. Até hoje eu não sei se ela faleceu de Covid-19, porque era uma senhora solitária, sem filhos e com os sobrinhos morando fora da cidade. Eu até cheguei a ajudá-la indo na farmácia e na banca de jornal, mas por conta da pandemia quase ninguém saía de casa. A pandemia teve um impacto grande no meu trabalho em 2020. Como trabalhava com a digitalização de documentos audiovisuais e dependida de equipamentos de meu sócio que estavam num coworking, não conseguia trabalhar e, ao mesmo tempo, todos os projetos que estavam acertados, acabaram suspensos. Foi um momento de muita incerteza e com as minhas economias indo embora com gastos de aluguel e alimentação, onde refleti muito sobre os meus rumos profissionais. No começo do ano passei para o mestrado na Universidade de Amsterdam e pensei que seria bom ter uma experiência fora do Brasil, Já estava com a passagem comprada para Setembro, quando veio a pandemia. Em parte, foi bom porque pude assistir as aulas remotamente e em, teoria, economizei um grande valor em Euros. Mas como esse Mestrado tinha muitas experiências práticas, acabei perdendo muitas oportunidades que as turmas dos anos anteriores tinham (visitas técnicas, oficinas, disciplinas práticas, etc...). Meu vôo foi adiado três vezes. O Brasil virou um pária internacional com o surgimento da variante P1 aqui e nenhum país estava recebendo mais brasileiros. Acabei fazendo todas as disciplinas online e hoje preciso fazer um estágio, mas diferente dos meus colegas que estão na Europa, estou com dificuldades em ser aceito em alguma instituição de lá. A instituição tem sido muito compreensiva com as minhas dificuldades acadêmicas e até para encontra o estágio, mas ainda assim o cenário é de incerteza quanto ao futuro.
Em meados de Setembro de 2020, o coworking onde estavam os equipamentos de meu sócio foi reaberto e alguns projetos voltaram. Acabei me arriscando, pegando o metrô em horários alternativos para evitar aglomerações para conseguir algum dinheiro para me sustentar. Fiquei com suspeita de Covid em pelo menos 3 vezes, mas fiz o teste PCR e o resultado foi negativo. Segui com os escassos trabalhos que permitiram pagar as minhas contas. No começo de 2021, fui chamado para ser bolsista do projeto "Arquivos da Pandemia...", na Casa de Oswaldo Cruz, o que para mim foi um grande alívio e uma enorme satisfação. De pronto aceitei trabalhar com excelentes profissionais e em uma instituição que já fez tanto pelo Brasil e talvez seja a principal responsável, junto com o Instituto Butantã e o SUS, por atenuar as graves consequências da pandemia e do desgoverno. Como bolsista desse projeto, me sinto responsável por trazer um pouco da minha vivência durante a pandemia e contribuir com alguns momentos em imagens de um dos períodos mais complicados pelo qual eu passei. Minha mais grata e querida contribuição foi a minha foto sendo vacinado com a vacina produzida pela Fiocruz justamente no mês em que chegamos aos 500 mil mortos. Foi e continua sendo muito difícil, mas obrigado a todos aqueles e aquelas que contribuem para vencermos esse pesadelo".